Quando se viu, também nas praças, nos jardins, nas estradas. Nos campos,
montanhas, praias, heliportos, becos, escadarias, átrios, alamedas, vielas e
morros.
Mais e mais gente aderindo. Bastava
um espacinho plano ou nem tanto. Umas pessoas juntas.
Uma lata, ou pacote, ou papel amassado, ou caixa, meia, moeda, tampinha,
boneca, madeira, fruta, legume – até bola valia.
Chutes, gritos, abraços, comemorações,
corridas, risos.
De uma cidade multiplicou-se pra outra. De outra, pra outra. Desta, pra
mais uma. Daquela, pra outra e da outra pra outra e pra mais uma.
Era um território!
Uma quantidade!
Uma infinitude!
Toda a população correndo, suando, misturando-se sem regras, sem juiz, sem
federação, sem clube, sem divisas, sem fronteiras, sem comando, sem estádio,
sem nada.
Traves imaginárias, milhões de
jogadores, bolas para quem quisesse, chutões pro alto, dribles, tropeços, gols
sem contagem.
Uma hora a coisa tomou o Brasil todo.
Um gol na foz do Arroio Chuí. Outro,
na nascente do Rio Ailã. Lateral, só se a bola passasse a Ilha Trindade, de um
lado, ou a nascente do Rio Moa, do outro.
Uma, muitas, todas as peladas do Brasil ao mesmo tempo.
Nenhum palmo do país vazio.
Sem hora pra acabar.
Todos jogando. Sem time de fora.
A manifestação das peladas. A revolta das peladas. A revolução das
peladas.
Com objetivo, causa, bandeira, lema e
horizonte muito claro: o futebol.
Não este que temos por aí.
Mas o futebol na sua essência.
Nu e cru.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)