A bola na marca.
A certeza de que ela
será disparada com força, no canto oposto, rasteira, ou no meio do gol vazio, ou
na sua cara, na sua testa, na boca do estômago.
A imensidão em torno dele, à disposição do artilheiro a apenas
onze metros de distância.
Os segundos arregalam
o pavor.
Bumbos nos tímpanos.
Gongos nos pavilhões.
Zumbido.
Súbito, o punhal da
covardia lambe-lhe a coluna.
Tem então a certeza de que não importa que a bola vá para fora,
ou que bata na trave, ou mesmo que ele a defenda.
Porque está claro que
ali é a pequenez frente ao Universo. A fragilidade encurralada pelo
indestrutível. O transitório domado pelo eterno.
O alvo acocorado e a goela do canhão a onze metros, para acertar
onde queira com a potência que bem entenda.
Não importa se a bola
vai para fora ou se bate na trave ou se ele a defende porque ele haverá de
sempre estar ali, na mesma posição, a alma esfarelando, o corpo apodrecendo, os
estampidos e os gritos, o lance à espera do desfecho agora antevisto.
Percebe que por todos os dias do futuro nenhuma defesa, erro ou
trave impedirá o lance verdadeiro, perfeito, do qual aquele em curso é mera sombra,
arremedo, ensaio.
Sabe então que a bola
branca, gelada e silenciosa permanecerá doravante à sua frente, a ponto de ser
atirada.
E prevê que haverá uma tarde, remota no futuro, em que seu filho
o carregará pálido e gelado, recolhendo-o no chão depois do gol indefensável
como a saraivada de um pelotão de fuzilamento.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)