23 junho 2019
19 junho 2019
IRE-1268
Teófilo Sena, filósofo popular das
ruas de Valença/BA, figura afável e querida, jeitão falador, vendedor de
produtos regionais, ou caixeiro-viajante, como ele se definia, nas suas
incursões políticas como candidato a vereador (nunca eleito) estrilava:
– Aprendi desde menino que todo
político promete como sem falta e falta como sem dúvida. Eu não vou ser
diferente.
Contam em Valença, história bastante
difundida, que lá um dia nas suas andanças comerciais, um cliente de Feira de
Santana pediu-lhe um sabiá cantador.
Só para clarear, o sabiá,
é característica da espécie, dorme com uma única perna. Recolhe uma sob as
penas e se sustenta noutra.
Prometeu e levou. Dias depois o tal
cliente liga:
– Seo Teófilo...
– Diga, mano. Qual é a pedida da vez?
– Não, é sobre o sabiá.
– Ele não está cantando?
– Não é isso, cantar ele canta, mas
parece que é aleijado, só tem uma perna...
– Ah, meu velho! Você pediu um sabiá
pra cantar ou pra dançar?!
(Levi Vasconcelos/A Tarde)
17 junho 2019
15 junho 2019
IRE-1266
Hermes Sodré marcou época na política de Feira de
Santana, como personagem folclórico (partiu para o outro lado em 2009, mas
ficou a fama).
Semianalfabeto, vereador, fiel escudeiro da dupla
Colbert Martins e Chico Pinto, no velho MDB, ficou famoso por proclamar
ingenuidades com pretensões filosóficas temperadas com o uso rasteiro da
sagacidade.
Contaram que certa feita ele avistou um enterro
descendo pela Avenida Getúlio Vargas, a principal de Feira. Imediatamente
passou a acompanhar e instantes depois estava aos prantos. Um amigo viu, foi
consolá-lo.
– Calma, Sodré. Em primeiro lugar me diga quem é o
falecido. Chorosamente, ele
respondeu:
– Não sei...
– Como você não sabe, se está chorando tanto assim?
E Sodré, indignado:
– Você é um insensível. Morrer é triste para
qualquer um. O nome só serve para botar na moção de pesar.
(Levi Vasconcelos/A Tarde)
13 junho 2019
11 junho 2019
IRE-1264
Era o que estava na Certidão:
Ulisses. Vinha de um filme antigo, de homens fortes, que o pai vira, e assim
lhe contara. Mas sempre foi Odi, o apelido cuja origem se perdeu.
Novo, quis sair da miséria rodando o
mundo, que eram as roças e cidadezinhas perto. Sempre jogando bola. Ganhava pra
comida, lugar de dormir, um par de sapatos.
Sem estudo, só com a Certidão – para
ele inelegível – amarrotada dentro do plástico.
Começou a entrar nuns times, já
ganhando uma coisinha aqui e ali. Mas sempre partia. A pé, de carona, com times
visitantes, crescia e se distanciava; quanto mais longe, mais adulto.
E amores. Um deles, uma professora.
Ela é quem leu seu nome e o sussurrou.
E contou-lhe a história do herói
grego. E leu para ele trechos do livro, explicando a trama e algumas passagens.
Mas por pouco tempo. Deixou-a por
outro time, outra cidade, derrotas e vitórias sem nenhuma importância.
Já mais velho, o tempo e a distância
o conduziram a lugares que pareciam outro mundo.
O chute fraco, a cabeça inclinada, as
costas baixas.
Depois sem amores, sem times, sem
forças.
Teve que parar de jogar.
Dormindo no mato, comendo na estrada,
mas ainda em frente, adiante, sempre ao contrário de onde viera.
Uma manhãzinha, claro-escuro, o sol
no rosto o sobressaltou.
Parecia uma bola subindo aos poucos
atrás do horizonte, fatia a fatia, até fazer-se redonda. Como as milhares que
dominara, chutara, cabeceara – mas percebeu que aquela era indomável.
Que sua trajetória diária, repetida,
é que o dominava.
Que o consumiria cada vez mais
rápido.
Fechou os olhos e lembrou-se da
professora, deitada em seu peito, depois da primeira noite – a manhã, como
agora, surgindo na janela –, balbuciando: "Logo que a Aurora, de dedos de
rosa, surgiu matutina".
Ergueu-se, bateu com as mãos a poeira
do corpo.
Virou-se para o lado oposto ao da
direção em que seguia.
Era hora de voltar.
(Texto de Luiz
Guilherme Piva)
09 junho 2019
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