O tesoureiro olhou triste e
respondeu: “Então o senhor está me devendo 696 cruzeiros, que é o que preciso
pagar de despesa hoje”. O assaltante endureceu e mandou brasa: “Nada de papo
furado. Eu quero o positivo”.
O tesoureiro meteu a mão no bolso, puxou um papel grande e foi dizendo ao
assaltante: “Tem um lápis aí?”. O bandido respondeu que não, então o tesoureiro
pediu ao guarda de trânsito que ia passando. Deu o lápis para o bandido e
ditou: “Renda do jogo: 62.568,25. Escreveu?” – “Sim”.
“Então tome nota do resto. Mas vamos
aqui para debaixo da luz que é melhor”. E foram os três mais um garoto daqueles
que pedem dinheiro para voltar para casa. Enxotaram o garoto e continuaram o
serviço: “Despesa: quadro móvel – 5.600; ingressos 341,00; luz 600 pratas”. Aí
o bandido gritou: “Qual luz? Aquilo paga?” – “Paga sim e mete lá: bolas 190,00;
taxa de 10%, 5.573,80; Escoteiros, 557,30″. O bandido pulou de novo: “Que
escoteiros? Isto é golpe!”.
O tesoureiro explicou que era uma lei e até se lembrou do número e prosseguiu:
Fugap, 1.114.66. Novo berro: “Esta não! Os clubes não descontam para INPS? Que
negócio é este? Eu também desconto”. O tesoureiro explicou a outra lei e foi em
frente: “CBD, 3.128,41; Federação Carioca, 3.128,41″. O bandido era inflexível
e chiou: “Este número já entrou aqui agora pouco. Para cima de mim, não!”. O
guarda que estava prestando atenção explicou: “Estes são outros 3.128,41″. O
tesoureiro ajeitou os óculos e prosseguiu: “Juiz, bandeirinhas e intérprete,
1.800,00″.
O assaltante já ia puxando a arma,
mas o tesoureiro explicou: “Intérprete é rubrica, compreendeste? Só se paga em
jogo internacional e contra times de São Paulo”. O bandido fez sinal de
entendimento e o tesoureiro deu a última despesa: cota do Cruzeiro 18.089,00 e
cota do América, 12.904,00. O bandido ficou meio triste, mas disse: “Vai lá,
manda pra cá isso mesmo”. O tesoureiro não se alterou e puxou outro papel do
bolso com uma porção de assinaturas. Resumindo, lá estava: vinte e um bichos a
600,00 cada, são 12.000,08. Despesas de transporte, 1.000,00. “Eu dei um vale
de 698,00 para o homem que ficou de passar lá amanhã. Tens algum aí? Lá no
clube não tem nada”.
Como não havia mais trânsito o guarda foi embora, o tesoureiro também e o
bandido deu no pé.
(Texto do jornalista João Saldanha 1917-1990)