Onde havia sol, pessoas, gritos, risos, xingamentos, onde
os jogadores enredavam e terçavam sagas, agora o que há?
As cores, os gestos, os suores, as bandeiras, o calor do
cimento, a luz da grama, o gemido das chuteiras, o zumbido que roubara a todos
do tempo e do espaço, onde foram parar?
Quando o jogo acaba, e saem os jogadores e os torcedores,
e depois as luzes, e depois, bem depois, os ecos dos gritos e choros, e só
então as sombras dos chutes e passes, e o espectro dos olhares, e os espantos e
as dores, e as lembranças imaginadas, e as almas e vozes rasgadas, o que é que
ainda fica lá?
O que acontece quando todos saem de lá?
Quando tudo é escuro, quando tudo é fundo, quando ninguém
vê nada, quando não há mais nada, nem ninguém para ver o nada, o que ainda
existirá?
No campinho, no terreiro, na várzea, no estádio – onde
havia tanta vida, o que fica em seu lugar?
Algo como o que chamam morte?
Não.
Acho que não é isso o que há.
Porque cada jogo não é só uma vida. É toda a história da
vida, é toda a criação; o céu, a terra e o ar.
E quando o jogo acaba, acaba tudo. Não há mais nada: nem
vida, nem morte, nem céu, nem terra, nem ar.
O próximo jogo será outra história, outro mundo, outro
sopro de outro deus, outra aventura sem antes nem depois, outros seres surgidos
do mar.
E ele, como todos os que houve antes, como todos os que
ainda virão, depois do apito final, depois da saída de todos, quando o oco, o
fundo, o vórtice, quando o eclipse, o vácuo e o silêncio baixarem, ele também
acaba.
E eis que de novo, no campo vazio, de novo não há mais
nada.
Nem haverá.
(Texto de Luiz
Guilherme Piva)