O jogo começa e a movimentação o atordoa. Percebe que,
como nunca antes, pode olhar e se mover para todos os lados. Bolas divididas,
marcação intensa, faltas, impedimentos. Não sabe o que fazer.
Esforça-se, mas aquilo é muito estranho. Sempre jogara
parado: um drible, um corte, um chute ou o passe fatal para o centroavante.
Agora aquela correria.
Pior: seu time joga em contra-ataques, e ele, na ponta
direita, é o responsável por receber os lançamentos, correr pela lateral ou
fechar para o meio em alta velocidade. Ele tenta algumas vezes, mas não
consegue.
Jogara mais de trinta anos de ponta-direita no pebolim do “Negro” Fontanarossa. Quase dez
mil gols marcados. Fora os milhares que dera para o centroavante, que deve ter
feito uns vinte mil. Aliás, onde ele estará? E os demais? Nenhum jogador em
campo ou nos bancos é conhecido. Ninguém veio do pebolim. Só ele.
Vem de novo a bola em sua direção, para ele partir
correndo. Mas ele não sai do lugar. Recebe e domina. Descumpre o comando do
joystick – escuta as mãos nervosas apertando os botões inúteis, os palavrões.
Fica com o pé em cima da bola. Posiciona-se onde sempre
jogara: estático, na frente, na ponta direita.
Todos olham. Ali ele se movimenta para um lado e para o
outro, com a bola sob a chuteira. Chega até o bico da grande área (“el área
18”). A defesa do outro time já voltara e estava em linha.
Ele olha, vê a brecha entre o zagueiro e o arqueiro e
solta a pancada. A bola bate na trave e entra.
Gol! Igual a muitos que fizera.
E ali ele fica. Não se mexe.
Se o quiserem no videogame, terá de ser como Fontanarossa
o consagrou no “metegol”.
(Texto de Luiz
Guilherme Piva)