Mas tem a técnica. O toque. O imprevisto que desmantela o
ferrolho, percorre a picada, invade a clareira e põe os companheiros na cara do
gol.
Só que já está cansado. Quer parar. Executa seus números
como o profissional no teatro mambembe, de cor, sem o ímpeto infantil que o fez
tornar-se adulto naquele ofício.
A categoria com que amacia e movimenta a bola intimida os
que cogitam criticá-lo por não correr, não marcar, por jogar tão calado.
Às vezes até ensaia-se um apupo.
Mas eis o passe de mágica – e a muralha à sua frente se
esfumaça. O milagre do centroavante livre na área. Palmas, gritos, espanto.
Nos bastidores, depois dos jogos, sua, respira forte. Não
quer mais seguir.
Mas é no palco, aliás, no campo velho e esburacado, com os
mesmos truques, aliás, lances, que consegue o almoço e a janta.
O pior é olhar pra frente: mesmo não podendo, sabe que
mais um pouco vai ter que parar.
O horizonte é claro: nada se vê.
E não adianta apertar os olhos.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)