13 maio 2019

IRE-1254

Sábado e domingo jogava pelada o dia inteiro. Não havia sítio, chácara, terrão, qualquer espaço, em que ele não fosse visto. Além de jogar bem, era beque e não se cansava – todos o chamavam e o queriam no seu time.
De noite, bebida, farra, zona.
Isso era também durante a semana. Descarregava caminhão durante o dia, corria uns dez quilômetros até em casa no fim do expediente (“pra relaxar”), tomava banho e caía na vida.
Magro e troncudo, canela fina e dura, cabelo empastado, calado, sempre calmo, idade imprecisa, parecia indestrutível.
Mas domingo passado sentiu. Deu um pique na lateral, a fisgada o pegou da coxa até as cadeiras, ele pôs a mão na cintura, parou, levantou o outro braço pedindo ajuda, e ficou ali, como um bule, travado.
Cercaram-no. Mudo, fechou os olhos, tentou dar um passo, virar o corpo, agachar – nada.
Quiseram carregá-lo mas ele recusou. Respirou fundo, esperou a dor passar, foi estourando o tempo, a pelada acabou.
Já escuro, só alguns ainda o aguardavam, a dor sumiu, aceitou o gelol nas costas, conseguiu se mover, bateu o pé no chão, sentiu firmeza, ajoelhou-se, deu um pulinho, disse que já estava bom e propôs:
– Bora lá, vamo pro jogo!
Não quiseram. Nem tinha número. Recomendaram que ele fosse pra casa. E que moderasse o ritmo; não dava pra seguir daquele jeito.
Foram embora. Em casa, decidiu. Largaria o trabalho de chapa. Aquilo ia acabar prejudicando seu futebol no fim de semana.
Tomou um banho e seguiu pra zona.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)