25 outubro 2017

Perdendo Sempre

A TV pequena, em preto e branco, cheia de chuviscos, faixas horizontais e verticais, sem som, ficava no fundo do botequim.
Os da frente ainda viam um pouco. Os do meio pra trás tinham que deduzir.
Mas todos vidrados em sagrado silêncio.
Fumo, cachaça, rapadura, pão velho.
Do lado de fora, nada.
Um terreno perdido e vasto.
Empoeirado.
Depois de morros e trilhas.
Era o único lugar por ali em que o pessoal das roças de todas as distâncias podia ver futebol.
Um deserto marrom.
Tufos de mato secos, queimados.
Cercas.
Só o telhado de amianto do boteco e a espinha de peixe da antena quebravam a paisagem.
Bicicletas velhas na porta.
As botinas do lado de fora pra não sujar o recinto.
Calor e moscas.
O ar parado.
De noitinha, todos de volta às suas distâncias.
À partida que eles venciam fugazmente naquelas horas de futebol aos domingos.
Todo o resto, antes e depois, dentro e fora do botequim, sem o futebol, era derrota.
E sem ninguém pra assistir.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)
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21 outubro 2017

Bebemorando

Sábado à noite, o sujeito resolve levar a mulher para tomar umas cervejas num barzinho.
Quando eles estão na segunda rodada, ela diz, assustada:
- Amor, você está vendo aquele cara ali naquela mesa, enchendo a cara de uísque?!
- Estou, por que? O que tem esse babaca?
- É o meu ex-marido! Eu me separei dele há sete anos e até hoje ele não conseguiu parar de beber!
- Não fala besteira! – discorda o marido – Ninguém consegue comemorar tanto tempo assim!
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19 outubro 2017

17 outubro 2017

Ecos do Eco

As Redes Sociais deram voz aos imbecis. Há de tudo por lá. Ainda é um mundo selvagem e perigoso. Tudo surge lá sem hierarquia. A imensa quantidade de coisas que circula é pior que a falta de informação. O excesso de informação provoca a amnésia. Informação demais faz mal. Quando não lembramos o que aprendemos, ficamos parecidos com animais. Conhecer é cortar, é selecionar.
(Umberto Eco [1932-2016], escritor, sociólogo, filósofo, linguística e bibliófilo italiano, especialista mundial em semiótica)
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15 outubro 2017

13 outubro 2017

Assinatura

Benigno Mattos, tabelião e vereador por cinco mandatos em Olindina, na Bahia, lá um dia recebe no cartório João Claro da Cruz, o João de Clara, semianalfabeto, morador da zona rural, querendo reconhecer a firma da própria assinatura, uns garranchos daqueles que saíram da caneta a duras penas.
Olhou, comentou com desdém:
– Isso é lá assinatura! Parece que uma barata fez cocô e a merda se espalhou pelo papel!
João reagiu:
– Quando você me pediu voto para vereador, a assinatura era essa e valeu.
– Mas você não votou.
E João, cheio de moral:
– Ah! E é por isso que minha assinatura virou cocô de barata e você não reconhece a firma, não é?

11 outubro 2017

Bastidores da Justiça

Apaixonado pela nova juíza da comarca, o advogado dirigiu-lhe a seguinte petição inicial:
Eu, bacharel em direito
conforme a lei em vigor,
venho com todo o respeito
requerer o seu amor.
Meu coração tem urgência
e, não podendo esperar,
peço que Vossa Excelência
me conceda a liminar.
Caso eu a tenha ofendido
com a inépcia do pedido,
rogo pelo amor de Deus:
Se me faltou algum tato,
prenda-me por desacato,
mas prenda nos braços seus.
Prontamente, a magistrada despachou:
Em toda a minha carreira
como juíza de direito,
nunca vi tanta besteira
nem tamanho desrespeito.
Minha conduta moral
é lei que não se revoga
nem com sustentação oral
debaixo da minha toga.
Por isso, ilustre advogado,
seu pedido tresloucado
indefiro nesta liça.
Depois, com a noite em curso,
eu aguardo o seu recurso
em segredo de justiça.
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09 outubro 2017

Vida Breve

Por que os cães vivem menos que as pessoas?
Aqui está a resposta, por uma criança de 6 anos:
Sendo um veterinário, fui chamado para examinar um cão de 13 anos de idade chamado Batuta. 
A família esperava por um milagre.
Examinei Batuta e descobri que ele estava morrendo de câncer e que eu não poderia fazer nada...
Batuta foi cercado pela família. O menino, Pedro, parecia tão calmo, acariciando o cão pela última vez, e eu me perguntava se ele entendia o que estava acontecendo. Em poucos minutos, Batuta caiu pacificamente dormindo para nunca mais acordar.
O garotinho parecia aceitar sem dificuldade. Ouvi a mãe se perguntando por que a vida dos cães é mais curta do que a dos seres humanos...
Pedro disse:
- Eu sei por quê!
A explicação do menino mudou minha maneira de ver a vida.
Ele disse:
- A gente vem ao mundo para aprender a viver uma boa vida, como amar aos outros o tempo todo e ser boa pessoa, né?! Como os cães já nascem sabendo fazer tudo isso, eles não têm que viver por tanto tempo como nós.
Moral da história:
Se um cão fosse seu professor, você aprenderia coisas como:
* Quando teus entes queridos chegarem em casa, sempre corra para cumprimentá-los.
* Nunca deixe passar uma oportunidade de ir passear.
* Permita que a experiência do ar fresco e do vento, na sua cara, seja de puro êxtase.
* Tire cochilos.
* Alongue-se antes de se levantar.
* Corra, salte e brinque diariamente.
* Melhore a sua atenção e deixe as pessoas te tocarem.
* Evite "morder" quando apenas um "rosnado" seria suficiente.
* Em um clima muito quente, beba muita água e deite-se na sombra de uma árvore frondosa.
* Quando você estiver feliz, dance movendo todo o seu corpo.
* Delicie-se com a simples alegria de uma longa caminhada.
* Seja fiel.
* Nunca pretenda ser algo que não é.
* Se o que você quer, está "enterrado"... cave até encontrar.
E nunca se esqueça:
Quando alguém tiver num mal dia, fique em silêncio, sente-se próximo e suavemente faça-o sentir que você está ali.
EIS O SEGREDO DA FELICIDADE QUE OS CÃES TODOS OS DIAS NOS ENSINAM.

07 outubro 2017

O Tempo

O tempo é como um rio. Você nunca poderá tocar na mesma água duas vezes, porque a água que já passou, nunca passará novamente.
Aproveite cada minuto de sua vida e lembre-se:
Nunca busque boas aparências, porque elas mudam com o tempo.
Não procure pessoas perfeitas, porque elas não existem.
Mas busque acima de tudo, um alguém que saiba o seu verdadeiro valor.
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05 outubro 2017

02 outubro 2017

Time do Peito

O pessoal queria matar o gandula. O time local, depois de várias derrotas, estava ganhando justamente o jogo que poderia manter sua chance de não ser eliminado.
Pendurados no alambrado, trinta do segundo tempo, um a zero, os torcedores gritavam pra segurar o jogo, pra cair, pra demorar no tiro de meta, pra chutar pra longe. Por duas vezes a bola caiu na torcida e não voltou enquanto dois cabos não foram lá pressionar.
E o gandula faz aquilo? Na primeira vez passou, na segunda o xingaram, mas na terceira queriam pular o alambrado e pegá-lo. Ele era um corisco: mal a bola saía, ele a pegava e entregava ao cobrador, tanto local quanto adversário. Tiveram que segurar um que ameaçou enfiar o pau da bandeira pelo arame para atingi-lo. O gordão que tocava o surdo quis lançar o instrumento lá do alto na cabeça do moleque. Se não fossem os dois cabos, nem sei.
Deu certo. O gandula parou de ir na bola e, de medo, acabou sumindo. A bola saía e os jogadores do outro time é que tinham que buscá-la.
Mas aí foi o médico. Com as quedas sucessivas dos jogadores pra ganhar tempo, ele começou a ser acionado. E não é que ele entrava correndo, jogava a aguinha, o spray, dava um tapinha no jogador e fazia tinindo pro juiz pra recomeçar?
Quase quarenta e o doutor já tinha entrado, nesse ritmo, umas cinco vezes. A fúria da torcida se voltou contra ele. Mas xingá-lo era um problema: cidade pequena, todos o conheciam e respeitavam, atendia nas comunidades carentes, às vezes não cobrava consulta, ajudava o time de graça – enfim, não dava.
O gordão do surdo mordia a baqueta, outros puxavam o cabelo, enroscavam a camisa, afundavam a cabeça nos joelhos e se desesperavam a cada corrida do médico pra dentro de campo.
Quarenta e três. O adversário no ataque. Pressão. Bola na trave, confusão na área, bate-rebate, escanteio. O goleiro finge a contusão e cai. Era hora de segurar de vez. Parar o jogo. Esfriar até acabar.
Mas eis que o doutor se levanta e começa a partir rápido pra atendê-lo. O do surdo não aguentou. Gritou: “Ai! Tô morrendo!”. Vermelho, a veia do pescoço saltada, os olhos saindo, a língua roxa, as mãos no peito. O surdo caiu-lhe das mãos e rolou os degraus e ele desabou babando.
O impacto do grito e da cena paralisou todo mundo. O silêncio chamou atenção. Abriu-se uma clareira onde o corpo dele jazia arfante.
O médico se virou, viu e ordenou: “Não mexam nele! Abram o portão!”.
Não tinha portão naquele ponto – rasgaram o alambrado e o enrolaram com força. O médico passou com a maleta, subiu os degraus e parou diante do corpo, que respirava com dificuldade, as mãos bambas, o olhar ermo. O médico fez massagem torácica, mediu o pulso fraco, jogou água no rosto, desabotoou a camisa, puxou as pálpebras, pôs o palito na língua – e ficou preocupado. Chamou os dois cabos e a maca, reuniu mais uns oito para aguentar o peso e iniciou, com cuidado, a remoção.
Atravessaram devagar, com muita dificuldade, a distância até o portão, todos abrindo espaço e acompanhando apreensivos.
Perto da saída o corpo sacudiu forte, estrebuchou e caiu da maca. Foi um desespero: sustos, gritos, correria. De novo o doutor o examinou detidamente, verificou se havia fratura e comandou a operação de erguê-lo até a maca e conduzi-o até a ambulância.
De dentro do pequeno estádio ouviram-se a sirene, a aceleração e os pneus arrancando.
Tudo levou meia hora ou mais. O goleiro seguia caído. Já escurecia. A torcida urrava pelo fim do jogo. E o juiz a atendeu, para ira dos adversários. Acabou. Vitória local, euforia na arquibancada, foguetes, invasão de campo, esperança renovada para as próximas partidas.
Na ambulância, médico e paciente na parte de trás, em silêncio. Até que o torcedor se levantou, sentou-se na maca, segurou as mãos do médico e disse: “Obrigado, doutor! Eu estou ótimo. Não tive nada, não. Agora, por favor, me escute: o senhor nunca mais, entendeu?, nunca mais, pelo amor de Deus, tente atrapalhar o nosso time!”.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)