26 julho 2015

Ilustrador Infantil

Meu amigo Tiburcio 
(Texto de Paulo Cezar Guimarães)
Quem conhece a figura, sabe: Tiburcio só existe um, o meu amigo. Branco como a página em que escrevo este texto, desengonçado, comprido, óculos fundo de garrafa, fala mansa e pausada, cumprimenta a gente com a mão mais leve que uma pena. Mas não é por falsidade, não, é timidez mesmo. Se você consegue penetrar na intimidade dele, passa a conhecer uma pessoa admirável. Astuto, esperto, inteligente, criativo e, sobretudo, engraçado. Tão engraçado que resolvi contar três historinhas contadas por ele.
Certa vez, seu pai, que deve ser tão Tiburcio quanto ele, foi ao banco resolver um problema burocrático qualquer. Chegando ao caixa, percebeu que a moça tossia muito. Amável e prestativo, quis ajudá-la e disse-lhe que o melhor remédio para passar a tosse era levantar os dois braços e respirar fundo. Ela aceitou o conselho. Alguém de longe viu a cena e gritou: "É um assalto!".
Foi a maior confusão – conta Tiburcio.
As demais caixas se abaixaram, os outros funcionários esconderam-se atrás de armários e uma das subgerentes desmaiou. Pulou gente pra tudo que é lado. Até que o gerente, já debaixo de uma mesa, pensou: ‘Não pode ser. É o seu José. Ele tem 70 anos. Não pode estar assaltando’. Difícil foi esclarecer o caso à Polícia. 
Mas Tiburcio também tem as suas. Certa vez, no Rio, próximo à estação de trem da Leopoldina, meu amigo, que mora em Niterói, estava num ônibus. De repente, passou um trem cruzando a Avenida Francisco Bicalho e o ônibus teve que esperar. 
- Sem ter o que fazer - diz ele - fiquei contando os vagões do trem.
- Maior barato... 68 vagões. Contei tudinho, não deixei passar um sequer. 
Quando o trem acabou de passar, Tiburcio percebeu que o ônibus estava em silêncio total, as pessoas assustadas e o passageiro ao seu lado totalmente pálido.
- O que aconteceu com você? – perguntou meu amigo.
- Cara, você não percebeu? O ônibus foi assaltado – respondeu o passageiro.
- Ih! Então esqueceram de mim! – encerrou o assunto Tiburcio.
A última história ele chama de clássica, para mim é lírica:
- Estava cansado, com dinheiro no bolso e resolvi pegar um "frescão" para retornar à minha casa. Sentou-se ao meu lado um homem de terno, muito elegante e arrumado. No meio do caminho, puxou conversa comigo, com um jeito meio carente. Disse ser advogado, famoso, mas uma pessoa triste. Seus clientes eram bandidos, traficantes, marginais, corruptos. Abriu seu coração comigo e chegou a chorar. Contou que tinha medo de ser assassinado por um de seus próprios clientes. Durante toda a viagem, não me deixou falar um segundo.
Antes de sair, o advogado quis saber o que seu companheiro de viagem fazia. E Tiburcio respondeu:
- Eu? Ilustro livros de crianças. Não ganho dinheiro, mas sou feliz!

22 julho 2015

Prédio Ilhado

Um velho prédio residencial ficou "ilhado" no meio de um viaduto em formato de anel recém-construído em Guangzhou, na província chinesa de Guangdong.
O plano das autoridades era demolir o prédio para construção do complexo viário, mas vários moradores não aceitaram o acordo de indenização e preferiram  ficar, segundo a imprensa local.
As autoridades acabaram resolvendo fazer a obra mesmo assim.

20 julho 2015

Revolta das Peladas

Começou em algumas ruas. Depois se espalhou por outras. Tomou os terrenos, os pátios, os estacionamentos.
Quando se viu, também nas praças, nos jardins, nas estradas. Nos campos, montanhas, praias, heliportos, becos, escadarias, átrios, alamedas, vielas e morros.
Mais e mais gente aderindo. Bastava um espacinho plano ou nem tanto. Umas pessoas juntas.
Uma lata, ou pacote, ou papel amassado, ou caixa, meia, moeda, tampinha, boneca, madeira, fruta, legume – até bola valia.
Chutes, gritos, abraços, comemorações, corridas, risos.
De uma cidade multiplicou-se pra outra. De outra, pra outra. Desta, pra mais uma. Daquela, pra outra e da outra pra outra e pra mais uma.
Era um território!
Uma quantidade!
Uma infinitude!
Toda a população correndo, suando, misturando-se sem regras, sem juiz, sem federação, sem clube, sem divisas, sem fronteiras, sem comando, sem estádio, sem nada.
Traves imaginárias, milhões de jogadores, bolas para quem quisesse, chutões pro alto, dribles, tropeços, gols sem contagem.
Uma hora a coisa tomou o Brasil todo.
Um gol na foz do Arroio Chuí. Outro, na nascente do Rio Ailã. Lateral, só se a bola passasse a Ilha Trindade, de um lado, ou a nascente do Rio Moa, do outro.
Uma, muitas, todas as peladas do Brasil ao mesmo tempo.
Nenhum palmo do país vazio.
Sem hora pra acabar.
Todos jogando. Sem time de fora.
A manifestação das peladas. A revolta das peladas. A revolução das peladas.
Com objetivo, causa, bandeira, lema e horizonte muito claro: o futebol.
Não este que temos por aí.
Mas o futebol na sua essência.
Nu e cru.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)

16 julho 2015

15 julho 2015

Fogo X Ficus

01 31/01/1952 - Botafogo 6x1 Figueirense (Amistoso) [F]
02 29/08/1973 - Botafogo 2x2 Figueirense (Série A) [F]
03 28/11/1973 - Botafogo 0x0 Figueirense (Série A) [F]
04 19/06/1974 - Botafogo 2x0 Figueirense (Amistoso) [F]
05 15/11/1979 - Botafogo 0x0 Figueirense (Série A)
06 13/04/1983 - Botafogo 4x0 Figueirense (Amistoso) [F]
07 06/12/1990 - Botafogo 1x2 Figueirense (Amistoso) [F]
08 19/04/1995 - Botafogo 1x1 Figueirense (Amistoso) [F]
09 19/07/2001 - Botafogo 2x3 Figueirense (Amistoso) [F]
10 28/07/2002 - Botafogo 0x1 Figueirense (Amistoso) [F]
11 24/08/2002 - Botafogo 3x0 Figueirense (Série A) [F]
12 22/05/2004 - Botafogo 1x1 Figueirense (Série A)
13 12/09/2004 - Botafogo 1x3 Figueirense (Série A) [F]
14 26/06/2005 Botafogo 0x1 Figueirense (Série A)
15 05/10/2005 - Botafogo 0x1 Figueirense (Série A) [F]
16 01/06/2006 - Botafogo 2x3 Figueirense (Série A)
17 08/10/2006 - Botafogo 0x1 Figueirense (Série A) [F]
18 16/05/2007 - Botafogo 0x2 Figueirense (Copa do Brasil) [F]
19 23/05/2007 - Botafogo 3x1 Figueirense (Copa do Brasil)
20 12/08/2007 - Botafogo 1x1 Figueirense (Série A) [F]
21 02/12/2007 - Botafogo 1x1 Figueirense (Série A)
22 07/08/2008 - Botafogo 2x1 Figueirense (Série A) [F]
23 30/11/2008 - Botafogo 1x3 Figueirense (Série A)
24 03/08/2011 - Botafogo 0x2 Figueirense (Série A) [F]
25 05/11/2011 - Botafogo 0x1 Figueirense (Série A)
26 28/07/2012 - Botafogo 1x0 Figueirense (Série A)
27 24/10/2012 - Botafogo 2x0 Figueirense (Série A) [F]
28 03/07/2013 - Botafogo 1x0 Figueirense (Copa do Brasil)
29 24/07/2013 - Botafogo 0x1 Figueirense (Copa do Brasil) [F] (5x4pen)
30 20/08/2014 Botafogo 0x1 Figueirense (Série A) [F]
31 19/11/2014 - Botafogo 0x1 Figueirense (Série A)
32 20/05/2015 - Botafogo 2x2 Figueirense (Copa do Brasil) [F]
33 14/07/2015 Botafogo 0x1 Figueirense (Copa do Brasil)
00 00/00/0000 - 08 empates
00 00/00/0000 - 09 vitórias do Botafogo
00 00/00/0000 - 16 vitórias do Figueirense

14 julho 2015

Vavá Tapá

Fala, miséra! Com o Bahia já encaminhado para a Série A de 2016 e Jacó como artilheiro da galáxia, vou dar um tempo no futebol. Tá rolando o Pan lá na terra dos touros: Toronto. Eu não me arrisco a pisar meus pés lá, mas estou aqui ligado nas modalidades. Eu só acho que alguns esportes ganharam um nome presepeiro, mas que vou traduzir para meus xibungos. Tem um tal de badminton. Nome muito grã-fino para dizer "baba de peteca". Já joguei muito com a velharada do Porto da Barra. Garanto que eles ganhariam medalha fácil. Eu tô doido pra ver um tal de pentatlo moderno. São 235 modalidades em uma só, véi. O cabra tem que pular um monte de obstáculo com o jegue, depois lutar de peixeira, nadar, além de  atirar com garruncha de dois tiros e dar aquela carreira de 100 metros. Parece concurso pra ser cangaceiro! Se o cara ficar vivo, ganha medalha e um seguro de vida.  Mas o que pretendo acompanhar de perto, com todo amor e carinho, é a modalidade de Ingrid de Oliveira. Não sei bem qual é, mas garanto que ela terá minha torcida, meu coração, além de meu barraco com comida e biquíni lavado. Fui, banda mel!

12 julho 2015

Crise Grega

00) Consequências da crise na Grécia:
01) Zeus vende o trono para uma multinacional coreana.
02) Aquiles vai tratar o calcanhar na saúde pública.
03) Eros e Pan inauguram prostíbulo.
04) Hércules suspende os 12 trabalhos por falta de pagamento.
05) Narciso vende espelhos para pagar a dívida do cheque especial.
06) O Minotauro puxa carroça para ganhar a vida.
07) A Acrópole é vendida e aí é inaugurada uma Igreja Universal do Reino de Zeus.
08) Eurozona rejeita Medusa como negociadora grega: "Ela tem minhocas na cabeça!".
09) Sócrates inaugura Cicuta's Bar para ganhar uns trocados.
10) Dionísio vende vinhos à beira da estrada de Marathónas.
11) Hermes entrega currículo para trabalhar nos correios. Especialidade: entrega rápida.
12) Afrodite aceita posar para a Playboy.
13) Sem dinheiro para pagar os salários, Zeus libera as ninfas para trabalharem na Eurozona.
14) Ilha de Lesbos abre resort hétero.
15) Para economizar energia, Diógenes apaga a lanterna.
16) Oráculo de Delfos vaza números do orçamento e provoca pânico nas Bolsas.
17) Ári​​es, deus da guerra, é pego em flagrante desviando armamento para a guerrilha síria.
18) A caverna de Platão abriga milhares de sem-teto.
19) Descoberto o porquê da crise: os economistas estão todos falando grego!!!

07 julho 2015

Viva O Circo!

Dominou e enfiou pro ponta, mas o domador interceptou. No rebote, retomou a bola e lançou do outro lado, na medida pro centroavante, entre o pipoqueiro e o tiro ao alvo, terminar a toda a descida do tobogã e, de carrinho, tocar forte pro gol.
Mas lá, fechando tudo, tinha um elefante!
Aquele era o lugar em que ele, muito pequeno, conhecera os parques e os circos. Espaço disforme de mato ralo entre uma mureta e um ribeirão que agora era o seu campinho e de outras crianças.
Viu que estava misturando tudo. Mas não conseguia parar. E o jogo seguia.
Foi queixar-se ao juiz – que, ao sacar o cartão, puxou lenços de mil cores infinitamente. Ao apitar, soprou flores e fez pingar moedas da narina.
Distraído, atordoado, não viu o contrataque: a bola no alto, nas cadeiras giratórias, voou até a cabeça do homem mais alto do mundo. A sorte é que seu goleiro largou o trapézio, quicou na corda bamba e fez a ponte.
Pouco depois, recebeu sozinho na área, mas ela era cercada de espelhos: convexos, curvos, côncavos, distorcidos, ele era mil, a bola era fugidia, o carrossel de cavalinhos em volta o confundiu ainda mais.
Perdeu o gol.
O jogo ficou muito complicado. Na corrida, pra receber atrás do malabarista, se viu dentro do trem-fantasma e saiu perto da sua própria trave, branco de terror. Mulheres de maiô e paetê dançavam nas laterais. Na sua defesa os zagueiros de narizes vermelhos e sapatos bicudos trombavam e caíam.
Esfregou os olhos. Era delírio, óbvio. Viu o capim, os bambus fazendo as traves. Reboco solto. Fedor da água. Os molequinhos sujos com as camisas no joelho e ele descalço e sem camisa.
Olhou pro alto e o sol o hipnotizou.
Mas escutou a tempo o grito que o salvou de uma colisão dos bate-bates, entrou no caminhãozinho, que depois era um trenzinho, depois um aviãozinho – rodando em volta de um eixo, fazendo o círculo do meio de campo. A bola bem ali, na marca central.
Ele se moveu até ela, domou-a e arrancou pro gol com a molecada correndo em volta.
À sua frente, somente o engolidor de fogo. Se passasse por ele, era saco.
Mas, não. Tinha também o atirador de facas.
E a mulher-gorila.
E o homem mais forte do mundo.
E uma roda-gigante.
E um globo da morte.
E ficou de noite. Luzes o cegavam e arregalavam-lhe as pupilas. O escuro fechou-lhe os ouvidos. O ronco das motos junto com a musiquinha do realejo e o rufar da bateria.
Ele resolveu chutar sem pensar, sem mirar, sem saber nada.
A bola subiu. Ele olhava. Subia cada vez mais. Ele a via sumir, estrelinha ascendente no céu.
Mas tudo se inverteu de repente. É ele agora quem voava. O campo, o circo, o parque iam encolhendo e virando capinzinhos lá embaixo. Ele tocou o céu, parabolou – e começou a descer.
A despencar.
A velocidade aumentou. O parque, o circo, o campo foram se agigantando, foram virando o mundo todo, ele é que diminuía, mas ganhava peso, corpo, massa, velocidade.
E medo.
Rezou pra que o goleiro o defendesse. Ou para que caísse num tonel de água e se salvasse. Ou que houvesse uma rede de proteção.
E não havia.
Até hoje, anos e anos e anos, tantos anos depois, ele continua caindo.
O medo só aumenta.
E ele já sabe que não há goleiro, nem tonel.
Muito menos rede de proteção.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)