01 novembro 2014

Positivo, Operante

Aquela ali nem olha pro jogo. Só no celular. Que absurdo, tá dando mole pro espertinho de boné. E o maridão do lado, nada. Tá cego. Não tira o olho do campo.
O velhinho ali vem todo domingo. Xinga mais do que todo mundo. E ainda ensina pros netos. Cada palavrão que eu nem conheço. Vai acabar morrendo assim, espero que longe daqui. Podia ao menos dar um picolé pro garoto. Mão de vaca.
“Uuuh!”
É ridículo. Todo mundo de pé. Deve ter sido um chute perigoso. Adianta levantar?
Só de olhar pra cara deles eu sei onde está a jogada. Sei que time está atacando mais. Sei se o jogo é rápido ou lento. Se é bom ou ruim.
Aqueles ali ficam acompanhando o bandeirinha em vez de olhar o jogo. Ele corre bem aqui atrás de mim. Eles ficam em cima dele, pra frente e pra trás na arquibancada. Um levantou a mão com uma laranja pra jogar nele. Quando me viu, disfarçou. Pus a mão no cassetete de leve, sem ameaçar. Tá quietinho agora.
Tomara que os bebuns lá em cima não criem confusão. Já teve empurra-empurra. Daqui a pouco dou um rádio pra pedir reforço.
“Uuuh!”
Caramba, não sai gol e esse pessoal não desiste. Que graça? Melhor em casa, pela TV. Cerveja, pipoca, chinelo. Aqui essa barulheira, essa confusão. Ainda arrisca a tomar porrada.
O de amarelo. Acho que foi nele que desci o porrete no mês passado. Deixa eu ver. É sim. A marca roxa no braço.
Caramba. É a segunda bolada que levo na nuca. Esses caras não sabem jogar?
Mais uma e é neles que eu vou descer a mão.
Olha o cara de boné. Chegou perto dela. Fazendo sinalzinho. A safada ainda sorri. Dá vontade de avisar o chifrudo. Se bem que merece. Pronto. Passou o número do celular. Cansei de ver isso. É tudo vagabunda.
“Uuuh!”
Coitado. O da laranja não tira o olho de mim, morrendo de medo. Finjo que não vejo. Bem-feito. É pra aprender a respeitar. Ver quem manda.
Intervalo é ruim. O rádio fica essa mistura de chamadas e informações.
Não entendo nada. Hein? Prenderam? Segura. Depois do jogo eu vejo. Lá na saleta. Deixa o cabo com ele. Hein? De leve, sem machucar.
Nem um guaraná eles dão. Nem mexer, nem olhar pra trás. Nem sentar. Xixi é na farda mesmo. Fede tudo. Ainda bem que ponho proteção. Ninguém vê o molhado.
“Uuuh!”
Acho que vai ser zero a zero essa droga. Pelo menos estão atacando mais. Vai acabar saindo gol desse jeito. Podia. O pessoal ficava mais relaxado.
Cacete. De novo essa bola. O gandula ainda vem empurrando pra pegar. Vou dar nele, vai ver. Hein? Repete. Sim. Na saleta, já falei. Tá chiando.
Essa o bandeirinha errou, tenho certeza. Os caras estão furiosos. Querem matá-lo. O velhinho vai ter um troço de tanto xingar.
Na escuta? É, o de boné. A menina de bermuda fingiu que está indo ao banheiro. Isso. Ali perto da grade. Olha ele indo atrás. Pode reter. Não quero confusão aqui. Bobear, dá morte.
Ainda bem que vi. Mais um pouquinho esses dois acabavam se agarrando atrás da pilastra.
“Uuuh!”
(Texto de Luiz Guilherme Piva)