06 janeiro 2015

A Primeira Segunda

Você volta do fim de ano. Nem sabe de onde direito. Parece que saiu meses atrás para alguma dimensão localizada entre o Índico e a quinta-feira, ou era loira, ou borbulhava na piscina – vê, você ainda não pensa coisa com coisa.
Está de novo no local de trabalho. É o que dizem. Você concorda para não correr riscos.
E então resolve retomar pé do mundo com as coisas que de fato importam.
Em primeiro lugar, lê o noticiário futebolístico.
Aquela lista de reforços que seu time anunciava antes de você ter submergido (“onde foi o Reveillón?”), em que seis ou oito craques disputariam posição (“ou era Carnaval?”), virou um rol de nomes que você desconhece (“foi o champagne!”; “não saí ainda do caldo daquela onda!”; “a safada pôs algo na minha romã!”).
Você lê de novo. Zezinhoinho? Hermógenes? Cataldo? Salathiel? Joãozão?
Você olha o calendário. Não sabe o mês. Todos em volta sabem seu nome. É o que dizem. Você responde para não parecer louco.
Aquela lista de jogadores está em código?
Relê a lista e torce pra chegar de novo o fim de ano. Ou o Carnaval. E pensa que a morena dessa vez não escapará e você não apagará em cima do prato de lentilhas.
Em segundo lugar, você abre o extrato bancário.
Lembra que tinha o décimo terceiro. Uma parcelinha de bônus ou de PLR. Um guardadinho que você e a esposa (“meu Deus, é mesmo: eu sou casado!”) juntaram com esforço (“ainda bem que apaguei antes de fazer bobagem!”) e um limitezinho do cheque especial (“só se precisar, hein!, só em último caso!”).
Você arregala os olhos. Embranquece. Olha em volta. O calendário. As pessoas. Olha de novo o extrato e tem palpitação. A boca seca.
Nem limite do cheque tem mais.
Você está pior do que seu time.
Os que passam por você desejam um bom ano.
É o que dizem.
Você agradece.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)